A Importância e os Constrangimentos do Processo de Contraordenação Municipal

O  direito das contraordenações protege valores importantes à vida em sociedade tendo como finalidade imediata permitir à administração recorrer à cominação de uma coima para garantir a eficácia dos comandos normativos nos vários domínios de intervenção da administração.

Como é sabido, o alargamento das áreas de intervenção do direito contraordenacional, a matérias  de grande complexidade quer técnica quer económica, ditou a previsão de coimas com elevadas molduras sancionatórias e um leque variado de sanções acessórias.

À parte, têm surgido múltiplos regimes especiais , que pouco ou nada mantêm do tal Regime Geral de Contraordenações.

Consequência desta proliferação de regimes especiais é o facto de os vários procedimentos terem diversa natureza e diferentes regimes, levando a que a tarefa de qualquer interveniente ante esta panóplia não sai facilitada, a começar pela própria autoridade administrativa, passando pelos demais sujeitos processuais acabando nos tribunais, potenciando a incerteza e insegurança jurídicas.

Em determinadas situações, as autoridades administrativas têm competência de instrução e decisão relativamente a ilícitos sujeitos a regimes contraordenacionais diferentes, pelo que na mesma autoridade administrativa se processam e decidem contraordenações sob regimes diferentes – é o caso dos Municípios.

Atente-se a título de exemplo a diversidade de regimes existentes entre o RGCO e a LQCOAO – Lei Quadro das Contraordenações Ambientais e do Ordenamento do Território, o Código da Estrada e mais recentemente, o Novo Regime Jurídico das Contraordenações Económicas.

Esta divergência de regimes cria dificuldades aos intérpretes e aos aplicadores do direito potenciando a incerteza e insegurança jurídicas.

Por outo lado, se é verdade que a crescente intervenção do estado em setores transversais à sociedade tem levado ao surgimento de inúmeras contraordenações, ao aumento das molduras abstratas das coimas e à previsão de sanções acessórias de elevada severidade, que exigem um regime contraordenacional mais garantista, também é verdade que os “pequenos ilícitos”, as infrações com reduzida ressonância ética e desprovidas de censura social continuam a existir e, na nossa opinião , justificam um regime contraordenacional mais ágil, mais flexível e menos solene.

Estes pequenos ilícitos, representam uma fatia considerável da realidade do processo contraordenacional municipal.

Esta realidade social e normativa tão díspar talvez justifique a diferenciação de regimes jurídicos criando-se :

Um regime para as contraordenações mais complexas mais rigoroso e garantista que compense de alguma forma a severidade punitiva que estas evidenciam e outro regime mais ágil e célere para as contraordenações comuns .

E porque o RGCO não pode ser encarado como um instrumento de diminuição das garantias dos infratores face ao crescente poder punitivo das autoridades administrativas, também não pode ser visto como um instrumento de bloqueio à prossecução do interesse público subjacente ao processo de contraordenação.

Fundamental e urgente é conferir ao processo de contraordenação a importância e dignidade que o mesmo reclama, assegurando uma cultura de cumprimento de normas e a eficácia da atuação da administração na salvaguarda dos interesses públicos que estão subjacentes ao processo de contraordenação.

 

Isabel Paiva Santos

Chefe da Divisão Municipal de Execuções Fiscais e Contraordenações, Câmara Municipal do Porto

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